27.1.10

Mulher de Fases



A solidão meu amigo
Não cabe no teu sorriso
Deixe esse lamento para mim
Que já me acostumei a ele.

A lua precisa minguar
Para ser nova
E nova, voltar a crescer
Para ser lua cheia.

Nenhuma onda quebra em vão,
As vagas procuram a praia
Como amantes buscam beijos.

O desejo é dor,
É veneno necessário
Para aplacar iras,
Desejo que se quer vivido
Consumado em plenitude.

O dia antecede a noite,
A paixão ao amor,
A lua, mulher de fases,
A maré, vazante e enchente.

Fases da mulher,
A morte depois da vida,
A vida antes da morte,
Os ciclos se completam
Ciclos de mulher,
Porque tudo é sempre igual
E sempre tão diferente

O tempo

Eras
o lugar seguro
que mantinha meus pés no chão,
sempre firmes mesmo quando
o sonho me seduzia.

Eras
a noite de sono profundo,
o abrigo seguro,
a hora de acordar,
o tempo que não seguia,
o tempo em que eu passava
o tempo todo pensando em ti.

24.1.10

Basta um pouco de ar

Já não choro. Chorei demais, agora deixo passar o tempo. Engano o tempo passando por ele.Se olhar para trás sem reparar com atenção nas minhas mãos vazias sei que, depois de tudo,consigo escrever palavras verdadeiras. Não tenho a intenção de te tocar com elas, quero a cabeça leve do pensamento que me remetia a ti.

Talvez pelo avesso deste mundo deserto eu seja só um atalho fingido. Ao passar de cada pé sou apenas um fôlego cansado que desaprendeu como gemer. Um novelo de sentimentos calejados que depois se guarda no canto escondido de uma gaveta sem uso.

Estaria contorcida se não pudesse mais dobrar as palavras, se não as levasse dentro de mim, se numa impaciência qualquer não conseguisse soprá-las e torná-las mais leves em desordens hora pacíficas, outras nem tanto.

Há muito que me esmago com os pés sem que percebas. Mas tudo passa, está passando...

Distrações, impossibilidades, desculpas que não convenciam por si mesmas e também porque não tinha mais vontade em fazer de conta que era convencida por elas.
O único pedido de desculpas é voltar a não cometer os atos a serem desculpados, deixei passar algumas. Mesmo quando os atos que as motivaram voltaram a bater na minha porta , eu deixei passar.

Por que? Talvez porque antes das desculpas, aconteceram as promessas não cumpridas, promessas não solicitadas. Mas essa é outra história, repetida em tecla vezes de exaustão, do esvaziamento.

O inicio de mil pedacinhos de tudo se acumulando para formar o todo do nada em que transformamos o tudo.

Até esse passa.

Não senti amargo boca e nem o nó no peito quando te vi valsando só numa tarde vazia, só uns dedos finos ávidos por escrever o final de mais uma história. Colocar um ponto ao invés de mais uma vírgula, um ponto - pular de linha e paragrafo. O ponto final no fim do último capitulo.

Não penses que esses mesmos dedos escrevem motivados por alguma razão que seja a de tocar, já disse e repito que não. Se as minhas mãos que te recordam à força de tanto serem apertadas, se o meu olhar para trás ainda me faz lembrar de nós, não é com a mágoa e ressentimento que todos os fins provocam.

Não, não pretendo guardar esse tipo de sentimento que provoca a dor que faz rasgar cartas e fotos, ranger os dentes, fazer dos olhos órbitas marejadas e a alma um estado de inferno permanente. Devolvo o que é teu em silêncio, sem anunciar data e hora.

Tenho uma lembrança daqueles dias e noites, mas há muito não sorrio sem razão, toda vez que me lembro de um sonho ou palavras que queria partilhar contigo. A confiança foi se perdendo pelo caminho, eu senti necessidade de voar porque o jardim foi perdendo o viço por falta de cuidados.

Mil pedacinhos de alguma coisa se acumulando para formar um todo de nada.

Não te procuro mais nos lugares onde você não está para me ver. Se olhar para trás corro o risco de me apaixonar cegamente, sei que o meu caminho nunca foi traçado em sentido ao teu e o teu nunca me alcançou plenamente.

Já não choro quando penso em ti. Você foi a palavra bonita cheia de entusiasmo, tênue e a estocada funda. Se olhar para trás, para o NÓS que imaginamos, sou uma folha em branco. O quanto te quis já caminha para o esquecimento, foi a direção que me indicaste.

Já escrevo sem te sentir, eras como escreveste, um apêndice que ao ser cortado não faria falta. Uma fraude piedosa a me distrair de mim mesma e dos dias sem cor que me perseguiam.

Sinto falta do tempo em que não tinha tempo para desgostos de amor, quando não calava frases como “Não te amo mais”. Tempo em que fazia perguntas sem me preocupar com as respostas.

Tempo em que eu acreditava e amava incondicionalmente, mesmo que por pouco tempo. Tempo em que não sentia a necessidade de escorregar pelos dedos que me tocavam e me esconder dos olhos que me viam.

Um tempo em que eu fugia de casa às escondidas e voltava ao cair da noite sem medo dos castigos, destemida, nariz empinado e desafiando tudo e todos. Inconseqüente.

O teu abraço não foi capaz de calar as maiores tristezas e teus beijos não secaram minhas lágrimas.

Serei sempre um navio sem ancoradouro. Sigo sem te levar comigo, não posso...

16.1.10

A Pureza dos Vãos

Terreno desconhecido,
nunca dantes penetrado
sem medo,
violência,
dor ou paixão.

Uma vaga me empurra
vagamente
para o teu EU vago,
onde se quebram as fronteiras
entre o sagrado e o profano.

Ali estão todas as coisas,
gestos,
o dito e o não dito,
as necessidades intermitentes
(que não admitimos),
de ferir,
abandonar,
seguir,
ficar...

É nesse vão
que residem nossos detalhes,
habitados pelo tudo e nada
sem máculas e mágoas,
orgulho e abandono
entre o querer
e o querer inconfessável.

É no vão das pequenas coisas
que podemos existir,
o resto é tempo e espaço
onde eu ainda não sou,
e tu podes vir a ser.

1.1.10

Vagas à mais


Ninguém precisa saber
que o dia começou tarde,
que a dor sufocou no canto da alma
que o amor aconteceu
e já ninguém sabe se volta.

É assim que se prova a imprudência?
Trazendo para o mundo do faz-de-conta
as contas que não se contam mais?

O amor permanece?

Eu podia fingir que
não me habitavam as tuas ausências,
que a dor que me ensinaste a sentir
não era proposital pois eras meu porto de abrigo
e não o meu cais de angústia e solidão.

Não sei fingir assim...

Entre a tua alma e a minha
vaga um precipício de distanciamentos
que foste edificando com tuas ausências.

Ausências dentro das ausências do mundo...

Hoje eu quero esquecer
essa vaga onde nos deixamos cair por capricho.

Adormecer...

No lugar do coração uma vaga
a ser preenchida,
sou uma folha que se fechou
antes mesmo de existir.

Começar de novo porque existem
palavras que merecem o silêncio...

Tela:
Klimt

Dramas banalizados


Morreu?

Nada de dramas...

Logo irás renascer novamente,
Morrer novamente,
Renascer mais uma vez
Até morrer mais outra...

Assim, até que um dia
Não seja preciso morrer mais
Porque já vives outra história,
Outro sonho,
Outra vida.

Tua melhor faca

Ele já não tem mais desculpas
além da desculpa que culpas não tem,
traz mentiras que explodem
por todos os poros
e não mais se escondem.

Poderá ele contar uma história
sem gritar uma mentira,
Sem dar uma facada no mundo
e em mim?

Não, ele não pode.

Ele é a mentira que foge,
o engano que precisa se justificar
a si mesmo e aos outros.

Ele é a melhor faca
que trago cravada no peito,
já não chora nem sangra,
porque meu coração
vai deixando de fazer
fronteira com o dele.

12 anos atrás..)

Escrevi esse texto há anos atrás, ia para o lixo não fosse a leitura mais atenta. O que mudou de lá para cá? A resposta fica para o final....